Recebo do compa Pedro Alves uma entrevista que repasso na íntegra, embora extensa, mas de fácil leitura.
Coisa para meditar.
''O Estado criou estes caras''. Entrevista com Hélio Luz, ex-chefe da
Polícia Civil do Rio
Hélio Luz, radicado em Porto Alegre, sua cidade natal e onde residem
familiares, o ex-chefe de polícia do Rio de Janeiro (de 1995 a 1997,
durante o governo de Marcello Alencar) Hélio Luz acompanha com
interesse a situação do Rio. Delegado aposentado, Luz dirigia a
Polícia Civil do Rio quando agentes prenderam o traficante Marcio
Nepomucemo, o Marcinho VP, apontado como um dos líderes do tráfico no
Complexo do Alemão – para onde fugiram bandidos armados expulsos da
Vila Cruzeiro, na última quinta-feira.
A reportagem e a entrevista é de Carlos Etchichury e publicada pelo
jornal Zero Hora, 28-11-2010.
A imagem de jovens esfarrapados, armados com fuzis, escopetas,
metralhadoras e pistolas, não surpreende Hélio Luz.
– O Estado nunca teve uma política de segurança de médio ou longo
prazo. O Estado sempre atuou com uma política de segurança imediata –
diz.
Eis a entrevista.
Como funciona o comando do tráfico no Complexo do Alemão?
Ele é diferente das demais favelas. É preciso voltar no tempo. Um dos
fundadores do Comando Vermelho (CV), Rogério Lemgruber, o Bagulhão,
foi preso na Ilha Grande, na época da ditadura, e conviveu com presos
políticos.
Qual a influência da convivência com os presos políticos?
Quando ele saiu da Ilha Grande, começou a se organizar e se juntou com
outros líderes. Um deles era o Orlando Jogador, que era do Complexo do
Alemão. O Comando Vermelho começou a tomar o espaço de outras favelas,
mudando a relação com a comunidade. O pessoal que assumia não tinha
respeito com a população, porque era de outra área. O Orlando Jogador
cresceu naquela área até ser morto, em 1994. Em seu lugar, assumiu o
Marcinho Nepomucemo, o Marcinho VP (Vila da Penha), que era o braço
direito do Orlando. Ele era da comunidade, e isso fez toda diferença
(mesmo preso, Marcinho VP continua dominando o Complexo do Alemão).
As imagens da Rede Globo o surpreendem?
É uma situação antiga. Esta formação não foi feita em dois anos, cinco
anos. Ela foi feita ao longo de 30 anos. Eles conseguem se sustentar
no Complexo do Alemão, diferentemente de outras áreas, porque são de
lá. Eles conhecem bem o terreno e a comunidade. Mas eles não
constituem exército, milícia, coisa nenhuma. É um bando de garotos que
não têm nada na cabeça. O fato de eles fugirem juntos supõe algum
nível de organização de enfrentamento. Mas não têm.
Qual foi o momento em que o Estado perdeu o controle da situação?
O Estado nunca teve uma política de segurança de longo prazo. Nem de
médio prazo. O Estado sempre operou com política de segurança de
resultados. Há duas causas para o que nós estamos vendo. Uma, mais
remota, e mais grave, que é a questão social. Outra, mais próxima, é
restrita à área de segurança.
A impressão é de que se trata de um grupo organizado.
Quando ocorre esta ação espetacular, você pensa que o Estado venceu e
que nós estamos derrotando um inimigo. Mas eles não são inimigos do
Estado, eles são integrantes do Estado, mas foram marginalizados. O
Estado criou estes caras. É produto direto do que nós fizemos. Num
nível mais direto da segurança é resultado da corrupção das polícias
do Rio.
A polícia do Rio é corrupta como mostrou os filmes Tropa de Elite e
Tropa de Elite II?
É muito mais. Se fosse como o filme, seria ótimo. O grande problema é
quantas vezes estes garotos foram presos e soltos? Foram para
delegacia e liberados? Nem fichados são. Por quê? Porque tem acerto.
Eles existem pela permissividade da polícia. Além disso, há questões
de fundo. Eles prendem estes 200 que nós vimos fugindo, mas vão
colocar aonde? E os outros, sei lá, 20 mil que têm no complexo com a
idade deles? Tem política para eles? Vai ser proporcionada uma vida
decente para eles? Como será feita a manutenção da área ocupada?
Qual a opinião do senhor sobre as UPPs?
É interessante. Eu não entendo por que colocam recrutas para montar
UPPs. Eles dizem que, na média, são uns 200 recrutas com um oficial.
Nas 14 UPPs dá algo em torno de 2,8 mil recrutas, 3 mil recrutas.
Então, 3 mil recrutas estão resolvendo a situação da criminalidade no
Rio? Tem um contingente de 40 mil policiais, mais 10 mil na Polícia
Civil, que não resolveram o problema da criminalidade. É isso que
estão dizendo? Se é isso, estão confirmando que o problema é
corrupção.
Qual a solução para o Rio?
Luz – É desconcentração de renda. Quem tem de dar palpite sobre a
segurança no Rio é aquele professor de Pernambuco, o Mozart Neves
(ex-reitor da Universidade Federal de Pernambuco, integrante do
movimento Educação para Todos). O negócio é educação. Não tem saída.
O senhor já participou de grandes operações no Complexo do Alemão?
Já participei de operações, mas não de grandes operações. Não precisa.
Claro que agora, com essa situação, são necessárias mobilizações. Mas
os principais vagabundos do Rio foram presos sem dar um tiro. Tu
prende o cara no asfalto.
Esta é a situação mais crítica do Rio?
Em 1994, havia 140 pessoas sequestradas no Rio. O problema era muito
sério. Os empresários, na época, queriam sair do Rio. Eles faziam
seguro com empresas americanas para ter segurança na cidade. Foi um
período de caos. Acabou o sequestro no Rio. Por que acabou? Porque a
polícia antissequestro parou de sequestrar.
Fico pasma com estas revelações e feliz que existam pessoas com capacidade de descortinar tanta sujeira.
ResponderExcluirBenvido sou sua fã, um beijão