O Santo Pato
Ethelberg Von Reinstroff é um homem de bem, um cidadão
correto, branco como a neve, morador na Uberlindia meridional, e religioso adorador de um totêmico pato
amarelo. Levava uma vida recatada e gostava de andar em sua rua sentindo o
cheiro matinal das araucárias, que os vulgos chamavam de pinheiros.
Experimentava uma paz, um silêncio, uma segurança que só se consegue entre seus
iguais.
Tudo isto desmoronou desde o dia em que um grupo de gente
estranha, muito estranha, acampou na sua
rua. Mais precisamente na pracinha das
araucárias.
Era um tal movimento de Ocupa o Pinhal. Que desde seu titulo
já éra uma ameaça à moral e bons costumes, porque Ocupa o Pinhal dito de forma
rápida era o cu po pinhal.
Mas o tal acampamento era um
protesto que exigia a imediata contratação de tradutores de javanês, o
javanês havia se tornado a língua oficial da
elite da Uberlíndia incompreensível para a maioria do povo.
Fato é que a partir
deste acampamento acabou a paz e sossego
do cidadão Ethelberg Von Reinstroff e seus vizinhos.
E ele explica que se sente intimidado toda vez que precisa passar pela rua
para entrar ou sair de casa.
Sua
esposa, a sra Gerda Von Reinstroff und Reisntroff
também denunciou: Estamos tendo dificuldade de locomoção. Muitas vezes
nós temos que andar algumas quadras a mais para entrar pelo acesso correto.
O
vizinho deles sr Frederic Von Ribbentrop ajuntou: Ocorre que passar pelo meio dos
manifestantes a gente se sente intimidado porque o pessoal vai saindo da frente
devagarzinho, e eles vão te encarando, vão olhando para você de uma forma
intimidadora, só porque você não é javanês.
muitos deles vão colocando a mão gordurosa no nosso automóvel, como essa
gentalha, de uma cor fulva, cabelos em desalinho, e sapatos sujos se atrevem a
tocar em nossos automóveis?
Está
terrível disse a senhora: até meu cachorro entrou em depressão, e quase morreu
depois que essa chusma deu a ele osso de galinha para comer.
Ethelberg
prosseguiu: Ontem mesmo quando eu fui passar uma das pessoas ficou me encarando
e dizendo que eu era javanês… e todo mundo ficou olhando para mim, eu não quero
esta gente me olhando. Vou entrar com um pedido na Justiça proibindo esta
gentalha da Uberlindia Setentrional de ficar me olhando. Não quero essa gente
de cabeça chata e sotaque estranho me olhando. Incomoda muito.
É uma
gente suja. Queremos essa gente fora da Uberlindia, queremos nossa Uberlíndia
geneticamente limpa, em paz, onde à
noite possamos nos sentar em volta do fogo e assar marshmellows, cantar marchas
ao som de nossas panelas, e reverenciar
nosso deus o santo pato amarelo.
Ainda
bem que a Uberlínia é só uma fantasia deste autor.
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