Grande Otelo e Oscarito, os reis da chanchada na famosa cena do balcão de "Romeu e Julieta"
Não existe no Brasil a História do Riso. Quase não há livros. Pouquíssimas e muitas vezes inacessíveis teses. Não se o discute. Como se rir fosse simples . De fato, o é. Mas, os intelectuais, afastados do povo e da massa, não podem se permitir o simples. Confundem-no com o grosseiro, têm medo do Novo Mundo: abacaxis, bananas, mangas, feijoadas e grandes bundas — grandes seios —, grandes falos. Não podem se permitir ao riso alto e sonoro de um populacho que ri liberto porque sabe que "não existe pecado do lado de baixo do Equador"... o lado de baixo... o lado de um Paraíso Tropical e Latino. Um Paraíso de Mazzaropis, Oscaritos, Grandes Otelos, Aldas Garridos, Trapalhões, Carequinhas e Chicos Anysios. Um Paraíso onde o Riso é a própria voz de Eros negando poder a Tanatos — este Tanatos que é a Morte que habita nas profundezas, o algoz do Inconsciente mais profundo: Tanatos que envia suas fúrias para combater Eros, sob a forma de críticos sisudos, intelectuais limitados, para castrarem o falo erótico do Inconsciente libertado.
Foram necessárias décadas de distanciamento para que os intelectuais e os críticos descobrissem o valor das chanchadas para a cultura nacional, bem como de uma personagem como o Chacrinha, na tv. Foi preciso que estas formas de comédia já não oferecessem mais perigo ao surgimento e estabelecimento de outras formas exógenas de teatro e tv para que fossem aceitas nos compêndios culturais
Passamos de um divertimento de uma sociedade mais simples para as exigências de uma economia, e consequente sociedade, mais complexa, com novos mercados consumidores e novo público alvo que exigia estar mais consoante com os novos modelos europeus e pouco e pouco com o modelo norte americano.
Ainda assim o riso não morreu nas nossas telas, pequenas ou grandes. Ajustou-se aos novos tempos, e a novos comediantes como se nunca antes houvera outros.
Riso, voz de Eros. O riso ladino e latino da Commedia Dell’Arte. Erótico, pleno de clisteres, falos, bundas e sensualidade, e por isto mesmo: agressivo.
Riso solto que a elite associa como sinônimo de sujo, nojento, porcaria, vulgar, chulo, devasso, fácil, escravo, pobre, proletário e tantas outras classificações que visam, mais uma vez excluir segmentos grandes da população.
Apesar deles, a vida prossegue. A História do Homem não é a História da sua repressão, mas sim a História do seu Riso.
(Extraído do meu livro "Humor, Graça e Comédia" agora sendo revisto para a segunda edição após ter-se esgotado a primeira)